Autoridades

O evento reuniu representantes de diversas entidades, em prol do combate à violência doméstica

A Justiça Federal do Espírito Santo realizou na quinta-feira, 3 de agosto, em Santa Maria de Jetibá, sua segunda ação no programa “Justiça Itinerante – A Justiça Federal vai ao Cidadão”.

Os atendimentos foram realizados das 8 às 15 horas, no Mercado Municipal “Ricardo Henrique Alberto Jacob” (Feira Cidadã).

Nesta segunda edição, a JFES se juntou ao Tribunal de Justiça do ES (TJES) e ao Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região (TRT/ES) em evento realizado naquela cidade dentro da campanha Agosto Lilás, de combate à violência doméstica e familiar. A atividade foi promovida pela prefeitura municipal, por meio de sua Secretaria de Trabalho, Desenvolvimento e Assistência Social.

Na solenidade de abertura, representantes de diversas instituições se uniram e falaram em prol da causa: o Pastor Samuel, da 1ª Igreja Batista de Santa Maria de Jetibá; a gerente da Proteção Social Especial da Assistência Social Wanderléia de Deus Ferreira; a secretária de Trabalho, Desenvolvimento e Assistência Social Nelcelina Espíndula; o vice-prefeito Florentino Lauvers; o promotor de Justiça Lucas Lobato La Rocca; a juíza coordenadora estadual de Enfrentamento à Violência Doméstica e Familiar do TJ/ES Hermínia Azoury; a juíza do trabalho Suzane Schulz Ribeiro; e a cidadã Geisa Dantas, usuária do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS).

Rede de apoio

O Pastor Samuel, fazendo um paralelo com a passagem bíblica (Mateus 9:20-22) em que “Certa mulher, que fazia doze anos que estava com uma hemorragia, veio por trás de Jesus e tocou na barra da capa dele…”, chamou atenção para duas lições quando se trata de violência doméstica: “É necessário buscar ajuda e é preciso estender a mão a quem pede essa ajuda”.

Jeisa Dantas deu um depoimento repleto de emoção. Contou que viveu em situação de rua e um dia foi ao CREAS pedir ajuda para comprar uma passagem. “A equipe me acolheu e viu que não era só da passagem que eu precisava. Eu estava sendo humilhada durante anos”, revelou. Seu marido, segundo conta, repetia que ela “era negra, mendiga, vivia de resto”. E ela não tinha coragem de se separar, porque era grata por ele tê-la “acolhido”. E declarou: “Se todas as mulheres tivessem coragem de buscar ajuda venceriam, como eu venci. Eu não acreditava em mim. Hoje tenho acompanhamento de terapeuta, psicólogo, psiquiatra, um emprego. Descobri que ninguém é melhor do que ninguém. Tenho minha casa. Moro sozinha, cuido de 16 cachorros, ajudo meus vizinhos. Achava que ele era o homem da minha vida. Todo domingo eu tentava me matar. Criei coragem e denunciei. A coragem te faz vencer”.

A gerente da Proteção Social Especial da Assistência Social, Wanderléia de Deus Ferreira, enfatizou que a campanha Agosto Lilás é o ano todo e que “em briga de marido e mulher se mete a colher, sim”. “Não se cale. Juntos somos fortes e podemos evitar um feminicídio”, conclamou.

A juíza de direito Hermínia Azoury, coordenadora estadual de Enfrentamento à Violência Doméstica e Familiar do TJ/ES, que estava lá com o Ônibus Rosa da Lei Maria da Penha, exclamou: “Violência doméstica é avassalador! E não somente a agressão física. As marcas interiores são indeléveis”. E defendeu a participação de toda a sociedade nessa causa.

A juíza do trabalho Suzane Schulz Ribeiro complementou que “a violência doméstica é também violência de gênero”. “E a violência de gênero acontece em todos os lugares, em todas as instituições. Temos que buscar parcerias, alianças, em todas as entidades possíveis, para que as mulheres tenham coragem de se pronunciar em lugares de acolhimento. Seja na igreja, nas instituições, no Judiciário (depois que a violência já aconteceu). E também ressaltou a necessidade do auxílio e da parceria dos homens, citando a filósofa e ativista norte-americana Angela Davis: “Não basta não ser racista, tem que ser antirracista”. “Da mesma forma, não basta não cometer violência de gênero. Precisamos combatê-la.”

Nelcelina Espíndula, secretária de Trabalho, Desenvolvimento e Assistência Social de Santa Maria de Jetibá, relatou que a campanha Agosto Lilás (Lei 4969/2016) veio para intensificar a Lei Maria da Penha e que naquele município isso é mais que necessário. Segundo a secretária, “na cultura pomerana, o machismo é muito presente”, assim como a violência contra a criança e a pessoa idosa. Destacou a Justiça do Trabalho e a Justiça Federal como parceiros fundamentais para fortalecer cada vez mais a política em prol das mulheres.

O promotor de Justiça Lucas Lobato La Rocca destacou a importância do trabalho em rede. “Não somos ilhas. Somos vários setores que devem trabalhar juntos e articulados. Temos uma responsabilidade social além de nossas atribuições. Se recebemos um pedido de ajuda relacionado à violência doméstica, o que vamos responder? ‘Não é aqui’? Nossa obrigação, enquanto servidor, é encaminhá-la para onde ela será atendida”. O promotor também falou da dificuldade que muitas mulheres ainda têm de se reconhecerem como vítimas de abuso. “A relação de dependência afetiva é como se fosse usuário de droga. Tem que tratar. E a rede funciona”.

Florentino Lauvers, vice-prefeito de Santa Maria, declarou que a campanha Agosto Lilás é muito importante. “A violência contra a mulher cresceu muito em nossa cidade e em nosso Estado. Aqui tem muita pomerana e elas são muito caladas. Tem muita gente preocupada e é pra se preocupar mesmo. Se nós nos juntarmos, vamos conseguir diminuir isso”.

Atendimentos

Atendimentos

Após a solenidade, a Justiça Federal atendeu a cerca de 70 pessoas. Foram 10 aberturas de processos, 58 auxílios relativos a andamento de processos, preparação de documentos comprobatórios de atividade rural, orientações quanto a idade mínima e outros requisitos para aposentadoria e direitos ao benefício de auxílio-doença, desvio de documentos nos correios, FIES, FGTS, acompanhamento de processos e contatos com as varas respectivas e 12 encaminhamentos para atendimento por outros canais da JFES.

Maria Pereira do Amaral dos Santos, 60 anos, trabalha desde os 13 anos na roça. Entrou com pedido de aposentadoria rural em 2018 no INSS e queria saber como estava a situação. A servidora Ana Carla Marques, diretora da Divisão de Apoio Judiciário da JFES, prestou a ela a orientação necessária. “Foi muito bom. Nota 10. Tirei todas as dúvidas e, agora, vou fazer as coisas certas”, comemorou.

Nilton Paiva de Amorim, 51 anos, queria orientação de como requerer auxílio doença. Há três meses não consegue trabalhar. “Trabalho na roça desde os sete anos e meus dois joelhos estão com a cartilagem ‘comida’, não aguento de dor. Vim para saber o que preciso e o atendimento foi muito bom. Agora é só pegar os papeis. Está tudo ‘anotadinho'”, declarou, após ser atendido pela servidora Maristher Siqueira, supervisora do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cescon).

Atendida pelo servidor Rogério dos Santos Ferreira, a pomerana Florinda Koeler Jacob, 71 anos, também trabalha na roça desde os 7 anos e está tentando se aposentar. Conta que fez angioplastia há 12 anos. Entrou com processo de aposentadoria em Itarana, mas foi negado. “Não aguento trabalhar mais. Muito bom que vocês vieram aqui. Tenho colite e, quando vou a Vitória, passo muito mal na viagem. Sem contar o gasto. O salário não dá. Só a consulta é 400 reais”, desabafa.

A argentina Elba Margarida Gauto, 68 anos, mora há 36 anos no Brasil e está tentando se aposentar. Ficou ‘encantada’ com o atendimento que recebeu da servidora Fernanda de Souza Costa. “Ela me atendeu muito bem. Tenho dificuldade de falar com a advogada, em Vitória. Achei ótimo esse atendimento aqui, porque estou me informando melhor”.

O trabalhador Jovane Martinelli, 61 anos, sofre muito com artrite e artrose e queria saber dos seus direitos. “O atendimento foi excelente. Quem não conhece a Justiça Federal não sabe o que é bom. Eles procuram fazer o que é bom pra gente. Muita gente não tem informação. Só de ser atendido, fiquei feliz”.

Cidadania

O projeto ‘Justiça Itinerante – a Justiça Federal vai ao cidadão’ foi instituído pela Resolução nº TRF2-RSP-2022/00112, conforme determinação do Conselho Nacional de Justiça (Resolução nº 460/2022).

O programa é voltado para as populações mais vulneráveis e pretende atuar no campo da promoção da cidadania, facilitando o acesso à Justiça e à retirada de documentos básicos. No Espírito Santo ele é coordenado pelos juízes federais Américo Bedê Freire Júnior e Ronald Krüger Rodor, supervisor das Ações Pedagógicas de Cidadania e Educação para os Direitos e Deveres.

A primeira ação do “Justiça Itinerante” no ES aconteceu sábado passado, 29/7, no bairro Bonfim, em Vitória.