Mulher Poder E Democracia Dra Cristiane 1

Cristiane Chmatalik fala na segunda mesa redonda do evento

Com uma mesa formada por juristas e pesquisadoras sociais, o Centro Cultural Justiça Federal (CCJF), no Rio de Janeiro, deu início na manhã da quarta-feira, 11 de março, ao seminário da terceira edição do evento “Mulher, Poder e Democracia”.

Na ocasião, a advogada e desembargadora aposentada do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) Ivone Caetano, a desembargadora federal Simone Schreiber, do Tribunal Regional Federal – 2ª Região (TRF2), a vice-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Ana Tereza Basílio, e a mestre em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal Fluminense (UFF), Naiara Coelho, dividiram a primeira bancada do encontro, cujo tema foi “Mulher e Política”. A mediadora foi a doutora em História e pesquisadora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Ângela Roberti.

Além de palestras, a programação do evento, que se estende até a sexta-feira, 13, inclui comunicações coordenadas, exposições, saraus de poesia, leituras abertas de dramaturgia, rodas de conversa, concerto musical e exibição da mostra “Heroínas no Cinema”.

O encontro ocorre na semana de celebração do Dia Internacional da Mulher (8 de março) e dá destaque ao debate sobre as metas da Agenda 2030, da Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável, relacionadas ao combate à violência contra as mulheres e à igualdade de oportunidades na tomada de decisões políticas.

A abertura do seminário foi presidida pelo diretor-geral do CCJF, desembargador federal Ivan Athié, que, em sua fala, ressaltou a atuação feminina no Judiciário e lamentou que, apesar de as mulheres comporem mais da metade da população brasileira, sua representatividade nos tribunais ainda seja muito reduzida.

O magistrado lembrou que elas são minoria, sobretudo, nas instâncias superiores, e que apenas duas alcançaram a presidência do Supremo Tribunal Federal (STF), as ministras Ellen Gracie e Cármen Lúcia: “Ainda temos muito a avançar na cruzada contra a violência e o preconceito dirigidos à mulher, que ainda enfrenta grandes obstáculos para galgar cargos de poder na vida pública”, declarou.

O evento “Mulher Poder e Democracia” é gratuito e aberto ao público e a programação completa pode ser conferida no portal do CCJF (http://www10.trf2.jus.br/ccjf/iii-seminario-mulher-poder-e-democracia/). Dentre os que prestigiaram a abertura do seminário, estiveram o cônsul geral de Angola no Rio de Janeiro, Mateus de Sá Miranda Neto, a vice-cônsul, Suzana Pedro, e a diretora da Seção Judiciária do Espírito Santo, juíza federal Cristiane Chmatalik.

Números mostram discrepância

Primeira a palestrar, Simone Schreiber corroborou o discurso do colega de toga, apontando números que dão conta da disparidade entre mulheres e homens, inclusive no Judiciário. No TRF2, que a desembargadora integra, apenas cinco, ou 19 por cento, dos 27 componentes são mulheres. O percentual se repete nas cortes superiores: STF, Superior Tribunal de Justiça, Tribunal Superior do Trabalho e Superior Tribunal Militar.

Para Simone Schreiber, uma das explicações para a discrepância está na dificuldade das mulheres de conjugar as exigências profissionais e familiares: “Muitas vezes, a mulher abre mão de uma promoção que implique, por exemplo, uma mudança de cidade eventualmente prejudicial à educação escolar dos filhos. Isso não acontece com o homem, que não sofre a mesma pressão e, em geral, pode priorizar o progresso profissional”.

A fala seguinte foi de Ivone Caetano, primeira negra a se tornar juíza e depois desembargadora do TJRJ. Para ela, as próprias mulheres devem se conscientizar da sua luta e promover uma mudança institucional e estrutural da sociedade. Esse é o caminho, disse, para as transformações políticas necessárias à isonomia de gênero.

Fazendo referência ao duplo desafio que enfrentou em seu percurso pessoal – por ser mulher e negra –  Ivone Caetano defendeu que uma sociedade igualitária se constrói com a “miscigenação cultural e de pensamento” que, em seu entendimento, “é a nossa grande riqueza e força”.

Lapso de democracia

Na sequência, Ana Tereza Basílio assumiu a palavra, citando exemplos de mulheres que fizeram a história da Justiça brasileira. A pioneira foi Mirtes Campos, primeira inscrita como advogada no país, após sete anos esperando a autorização do Instituto dos Advogados do Brasil (IAB) para exercer a profissão (a inscrição hoje é feita pela OAB), no final do século 19. 50 anos depois, foi empossada a primeira juíza de Direito e outros 50 anos se passaram até que uma mulher ascendesse ao STF, a ministra Ellen Gracie, em 2000.

Após apontar para a necessidade de aperfeiçoamento na legislação eleitoral, que, para ela, ainda falha na garantia do acesso das mulheres aos cargos eletivos, a palestrante concluiu que a deficiência de representatividade feminina no poder público é “um grave lapso de democracia que defrontamos no Brasil”. Para comprovar, ela destacou estatísticas das casas legislativas, segundo as quais somente 15 por cento das cadeiras na Câmara e no Senado são ocupadas por mulheres, embora 51 por cento da população brasileira seja composta por elas.

A última palestra coube a Naiara Coelho, que apresentou informações da sua recente pesquisa de mestrado. Ela pontuou que a atuação das mulheres na política não se dá apenas nas instituições, sendo historicamente relevante também nos movimentos sociais. Por outro lado, também com base em dados de pesquisa, lamentou a carência de propostas legislativas de mulheres parlamentares, voltadas para a defesa das cidadãs nos níveis municipal, estadual e federal. Ainda, a cientista social denunciou que, mesmo quando essas pautas existem, poucas propostas importantes para a parcela feminina da população se tornam leis.

*Fonte: TRF2